quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

The Beaver


“Nossa época tem sido marcada pela ilusão de que a felicidade é uma espécie de direito. Existe a crença que a felicidade é um imperativo, que é possível viver sem sofrer, que as dores inerentes a toda vida são uma anomalia.” (Eliane Brum).


Essa frase é parte do pequeno texto “A tirania da felicidade” que se encontra na página 26 da Revista Ultimato de Setembro/Outubro de 2011. Eu li esse texto (e toda a matéria de capa intitulada "Alegria, Alegria, Por Favor!") alguns dias antes de assistir primeira vez o filme The Beaver (no Brasil: Um Novo Despertar). Não sei se por causa do pouco tempo que havia lido a matéria, mas tive a impressão que o filme tratava especialmente sobre esse tema: a felicidade!


Em geral, quando cultivo grandes expectativas em relação a um filme acabo me frustrando. The Beaver superou minhas expectativas e me surpreendeu de uma certa forma. Pretendo escrever aqui muito mais sobre a impressão que eu tive do filme e da relação com a matéria da revista, do que sobre o próprio filme. E claro, tentarei não contar o final (hehe...) e provocar alguma vontade de assistir o filme nas pessoas que lerem esse post.



O filme é dirigido por Jodie Foster, que também atua como esposa do personagem principal da trama: Walter Black (Mel Gibson). Walter é apresentado como um “indivíduo irremediavelmente depressivo”, sendo um pai de família ausente e um empresário fracassado (calma, tudo isso está na sinopse). 
Depois de ser expulso da própria casa e de viver uma tentativa frustrada de suicídio, Walter encontra a saída em um Castor (uma marionete, um fantoche de mão) encontrado no lixo(!). Como um ventríloquo, Walter conversa e recebe dicas do Castor, dando início a uma espécie de tratamento psicológico e dando espaço ao caráter tragicômico do filme.
A boa disposição e proatividade do Castor dão resultado e Walter deixa de ser uma pessoa infeliz para se tornar, rapidamente, um profissional bem sucedido, descobrindo inclusive que a aparência de sucesso e felicidade é uma mercadoria valiosa, ainda que superficial.


Assistindo pela 2ª vez o filme e realizando um mini e breve vídeo-debate com uma renomada e experiente assistente social, chamada Minha Mãe (hehe), percebi outras nuances podem ser lançadas sobre o filme. Como, por exemplo, a questão da loucura do personagem principal. Porém, nada conseguiu afastar da minha mente o tema da Alegria!


Isso porque o próprio filme apresenta Walter Black como um sujeito “irremediavelmente deprimido”. Ele é apresentado assim antes de conhecer o Castor e também depois de conhecê-lo! Ele já era capaz de trabalhar, sustentar sua família, cumprir seu papel de pai, consertar a torneira quebrada (aliás, que fixação é essa dos estadunidenses por torneiras quebradas?!). Ele poderia ser considerado um paciente curado em primeira análise. Mas, algo estava faltando! Ele estava preso a um boneco que tinha como padrão de felicidade, basicamente, o sucesso profissional e a boa reputação. A discussão parece ser algo que gira em torno de perguntas do tipo: O que é a felicidade?; A pessoa feliz é aquela que simplesmente não passa mais o ia inteiro deprimido?


Uma das partes que, dessa 2ª vez, achei sensacional, e que nem me lembrava, é um “diálogo” entre o Castor e Walter. Essa parte me fez pensar muito sobre a atitude egoísta de todos nós, quando buscamos a felicidade como “uma espécie de direito” e que acaba por alienar todos a nossa volta, ou que nos faz vê-los como meros intermediários para o nosso bem estar:


Castor – Eu não te dei exatamente o que você queria?
Walter – (Consente, sinalizando com a cabeça)
Castor – Você não precisa deles (sua família), Walter.
Walter – (Tenta dizer algo)
Castor – Eu te amo. Eu sou o único que realmente te ama. Por isso que eu nunca vou deixar você voltar.


Se o Castor não deixa de ser uma parte do próprio Walter, qual é a profundidade das frases “Você não precisa deles” e “Eu sou o único que realmente te ama”? 


Aqui, novamente quero transcrever uma parte da matéria da Ultimato:
A felicidade nunca acontece em uma sala fechada em cuja porta, do lado de fora, uma tabuleta avisa: “Não entre sem ser chamado”. A felicidade não depende do isolamento, do silêncio, de calmarias, de acessórios e assessores, da ginástica do chamado “pensamento positivo”.


A Ultimato, que é uma revista de cunho evangélico, lança uma visão cristã sobre o tema da felicidade (que inclusive é parecida com a que é passada no filme Into the Wild): a felicidade só é completa quando compartilhada! É totalmente diferente do pensamento do Castor: o Castor parece ser a personificação do pensamento egocêntrico dos nossos dias, amplamente sustentado pela indústria mercadológica e pelas campanhas publicitárias, de que o fim último de nossas vidas é o bem estar individual. É a propaganda que diz: “Pare de se contentar com pouco, você merece luxo, você merece qualidade, compre o automóvel x”. Qual é o lugar da família, da esposa, do outro para quem vive bombardeado pelo pensamento: você merece!




Novamente, lançar um olhar cristão para o problema parece, pelo menos para mim, resolver boa parte dos problemas: Há Alguém, fora do ambiente familiar, fora do ambiente do ego, fora do próprio mundo; Alguém que realmente merece toda a atenção, todo o objetivo último, toda a gratidão; esse Alguém é bom, se relaciona com os homens e, aliás, criou os homens no interior de um ambiente que pressupõe a idéia de relacionamentos. Por causa desse Alguém, é impossível imaginar a felicidade fora do ambiente comunitário. Somente nEle é possível uma satisfação plena. E, a partir dessa satisfação, Ele também se torna a motivação para a auto-negação pessoal em prol de terceiros, com vistas, entretanto, ao fim último de todas as coisas, que é a centralização de tudo e todos os envolvidos nAquele que é, Ele mesmo, a própria alegria.

Um comentário:

  1. Este post vai especialmente para
    Namorada e Mamãe, pela companhia para ver o filme.
    Nessa, que assistiu o filme sozinha e ficou tristinha.. snif snif
    Para Manu, Rebeca, Nádia, Priscila e Marcelo, psicólogos abuenses.
    E para Gui e Filipe, já que eu toquei no assunto do marketing e tal..

    Abraços galera
    e comentem à vontade!

    ps: gostei muito do filme e gostaria q uitas pessoas assistissem. Mas não se enganem: ele é bem triste!

    ResponderExcluir